Publicada a Lei da Liberdade Econômica: veja os destaques

A Lei nº 13.874/2019, publicada em 20 de setembro de 2019, também denominada como “Lei da Liberdade Econômica”, em razão da conversão da Medida Provisória nº 881/2019, institui, em definitivo, a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica e estabelece normas de proteção à livre iniciativa, ao livre exercício da atividade econômica e que versa sobre a atuação do Estado como agente regulador. 

Em informe anterior, apresentamos as linhas gerais sobre a Medida Provisória nº 881/2019. Para este informe, apresentamos uma síntese das principais alterações e destaques da Lei nº 13.874/2019:

Fundamentos e Aplicabilidade

  1. A Lei nº 13.874/19 foi editada com fundamento nos arts. 170, §1º, inciso IV e 174 da Constituição Federal e prevê observância obrigatória no âmbito do Direito Civil, Empresarial, Econômico, Urbanístico e do Trabalho.
  2. As normas de ordenação pública que regulam as atividades econômicas privadas devem ser interpretadas em favor da liberdade econômica, da boa-fé, do respeito aos contratos, aos investimentos e à propriedade.
  3. Haverá também aplicabilidade da referida lei em determinados aspectos de Direito Administrativo, Regulatório e Tributário.

Direitos de Liberdade Econômica

São Direitos relacionados à Liberdade Econômica:

  1. desenvolver atividade econômica (i) de baixo risco sem a necessidade de atos públicos de liberação da atividade econômica; (ii) em qualquer horário ou dia da semana, inclusive feriados, sem que para isso esteja sujeita a cobranças ou encargos adicionais, observadas as normas de proteção ao meio ambiente, os direitos de vizinhança, a legislação trabalhista, os contratos, convenções condominiais ou outro negócio jurídico;
  2. definir livremente (em mercados não regulados) o preço de produtos e de serviços como consequência de alterações da oferta e da demanda;
  3. receber tratamento isonômico de órgãos e de entidades da administração pública quanto ao exercício de atos de liberação da atividade econômica;
  4. gozar de presunção de boa-fé nos atos praticados no exercício da atividade econômica, para os quais as dúvidas de interpretação do direito civil, empresarial, econômico e urbanístico serão resolvidas de forma a preservar a autonomia privada, exceto se houver expressa disposição legal em contrário;
  5. desenvolver, executar, operar ou comercializar novas modalidades de produtos e de serviços quando as normas infralegais se tornarem desatualizadas por força de desenvolvimento tecnológico consolidado internacionalmente;
  6. negócios jurídicos empresariais paritários serão objeto de livre estipulação das partes pactuantes, de forma a aplicar todas as regras de direito empresarial apenas de maneira subsidiária ao avençado, exceto normas de ordem pública;
  7. nas solicitações de atos públicos de liberação da atividade econômica, o particular será cientificado do prazo máximo estipulado para a análise de seu pedido. Transcorrido o prazo fixado, o silêncio da autoridade competente importará aprovação tácita para todos os efeitos, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei;
  8. arquivar qualquer documento por meio de microfilme ou por meio digital, hipótese em que se equiparará a documento físico para todos os efeitos legais e para a comprovação de qualquer ato de direito público. A técnica e os requisitos serão estabelecidos em regulamento;
  9. não ser exigida medida ou prestação compensatória ou mitigatória abusiva, em sede de estudos de impacto ou outras liberações de atividade econômica no direito urbanístico, tendo a Lei nº 13.874/2019 indicado quais são as situações que configuram o referido abuso; e
  10. a administração pública direta ou indireta não poderá mais exigir certidão sem previsão expressa em lei.

O art. 3º da Lei nº 13.874/19 detalha e estabelece as exceções ao conteúdo normativo dos itens acima apresentados de forma sumarizada.

Abuso do Poder Regulatório 

No capítulo que trata sobre Garantias de Livre Iniciativa, a Lei nº 13.874/2019 estabelece o dever da administração pública em evitar o abuso do poder regulatório de maneira a, indevidamente:

  1. criar reserva de mercado ao favorecer, na regulação, grupo econômico, ou profissional, em prejuízo dos demais concorrentes;
  2. redigir enunciados que impeçam a entrada de novos competidores nacionais ou estrangeiros no mercado;
  3. exigir especificação técnica que não seja necessária para atingir o fim desejado;
  4. redigir enunciados que impeçam ou retardem a inovação e a adoção de novas tecnologias, processos ou modelos de negócios, ressalvadas as situações consideradas em regulamento como de alto risco;
  5. aumentar os custos de transação sem demonstração de benefícios;
  6. criar demanda artificial ou compulsória de produto, serviço ou atividade profissional, inclusive de uso de cartórios, registros ou cadastros;
  7. introduzir limites à livre formação de sociedades empresariais ou de atividades econômicas; e
  8. restringir o uso e o exercício da publicidade e propaganda sobre um setor econômico, ressalvadas as hipóteses expressamente vedadas em lei federal.

Análise de Impacto Regulatório

As propostas de edição e de alteração de atos normativos de interesse geral de agentes econômicos ou de usuários dos serviços prestados, editadas por órgão ou entidade da administração pública federal, incluídas as autarquias e as fundações públicas, serão precedidas da realização de análise de impacto regulatório, que conterá informações e dados sobre os possíveis efeitos do ato normativo para verificar a razoabilidade do seu impacto econômico. A Análise de Impacto Regulatório depende da edição de regulamento.

Aspectos Societários

  1. A sociedade limitada passa a também poder ser constituída por apenas uma pessoa, passando-se a oferecer uma alternativa à constituição de EIRELI;
  2. A desconsideração da personalidade jurídica passa a ter caráter excepcional, podendo ser aplicada nas situações em que se verifique a confusão patrimonial e/ou o desvio de finalidade – cujas definições foram estabelecidas pela Lei nº 13.874/2019;
  3. Ressalvados os casos de fraude, o patrimônio social da empresa individual de responsabilidade limitada não se confunde com o patrimônio do titular do sócio;
  4. O art. 85 da Lei nº 6.404/76 foi alterado, passando a oferecer novo tratamento para a subscrição e dispensa de assinatura de lista ou boletim de subscrição;
  5. Para atividades empresariais classificadas como de “baixo risco” não haverá a necessidade de “ato público de liberação”, conforme definido na Lei nº 13.874/2019. O Ministério da Economia editou a Resolução nº 51/2019 na qual há uma lista de atividades classificadas como de “baixo risco”; e
  6. A Lei nº 8.934/94, que trata do registro público de empresas, foi alterada de forma a buscar simplificação, maior uso de sistemas eletrônicos e eficiência tanto no registro empresarial perante as juntas comerciais, quanto nos processos administrativos a ela relacionados.

Aspectos tributários

  1. Alterações dos dispositivos do Código Civil que tratam da autonomia patrimonial das empresas e das hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica em grupos econômicos. Essas alterações reforçam o desacerto da PGFN e da Receita Federal (Parecer Normativo COSIT/RFB 04/2018) em suas tentativas de extrapolar as hipóteses de imputação de responsabilidade tributária a sócios e empresas do mesmo grupo econômico;
  2. Instituição de comitê competente para editar enunciados de súmula da administração tributária federal, os quais deverão se sobrepor às próprias súmulas do CARF;
  3. Automatização das hipóteses de dispensa da PGFN para contestar, recorrer e desistir de recursos nos casos em que houver posição definitiva do STF e STJ, súmulas e pareceres editados pela PGFN e pela AGU, e quando o benefício patrimonial não atender aos critérios de racionalidade, economicidade e eficiência. Os auditores da Fazenda Pública também estão dispensados de lavrar auto de infração nessas mesmas hipóteses; e
  4. Substituição do e-Social por sistema simplificado de escrituração digital de obrigações previdenciárias, trabalhistas e fiscais, a ser ainda desenvolvido e sob a expectativa de simplificação e maior praticidade operacional.

Negócios Jurídicos / Contratos

  1. Estabelece critérios para a interpretação de negócios jurídicos (altera o art. 113);
  2. Disciplina a liberdade contratual, os contratos paritários e a autonomia privada (altera o art. 421 e inclui o art. 421-A).

Fundos de Investimento

  1. A responsabilidade de cada cotista de um fundo de investimento passa a ser limitada ao valor por ele investido no fundo, e desta forma, o cotista não mais estará obrigado a aportar novos recursos caso o património líquido do fundo seja negativo;
  2. Os fundos de investimento, em geral, passam a poder contar com diferentes classes de cotas com direitos e obrigações distintos. Além disso, há agora a possibilidade de que cada classe de cotas tenha um patrimônio segregado, e uma vez adotada essa segregação de patrimônio, cada classe de cotas passa a responder somente pelas obrigações atribuídas à referida classe;
  3. A responsabilidade dos prestadores de serviços de fundos de investimento, incluindo os fiduciários, fica limitada aos atos exclusiva e individualmente praticados pelo respectivo prestador de serviços, não se estendendo aos demais prestadores;
  4. As regras de insolvência previstas no Código Civil (arts. 955 a 965) passam a ser aplicáveis aos fundos de investimento nas hipóteses em que o fundo com limitação de responsabilidade não possuir patrimônio para responder por suas dívidas; e
  5. O registro do regulamento do fundo de investimento perante a CVM passa a ser suficiente para garantir sua publicidade e efeitos perante terceiros.

Outros dispositivos

  1. Autorização para armazenamento, em meio eletrônico, óptico ou equivalente, de documentos públicos ou privados, compostos por dados ou por imagens; e
  2. Os registros poderão ser escriturados, publicitados e conservados em meio eletrônico, obedecidos os padrões tecnológicos estabelecidos em regulamento (altera a Lei 6.015/73).

Alteração da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):   

  1. A Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) obedecerá aos modelos que o Ministério da Economia adotar, devendo ser emitida preferencialmente em meio eletrônico;
  2. O empregador terá o prazo de 5 dias úteis para anotar na CTPS, em relação aos trabalhadores que admitir, a data de admissão, a remuneração e as condições especiais, se houver, facultada a adoção de sistema manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério da Economia;
  3. A comunicação pelo trabalhador do número de inscrição no CPF ao empregador equivale à apresentação da CTPS em meio digital, dispensado o empregador da emissão de recibo;
  4. A anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico fica obrigatória para estabelecimentos com mais de 20 trabalhadores, conforme instruções expedidas;
  5. Se o trabalho for executado fora do estabelecimento, o horário dos empregados constará do registro manual, mecânico ou eletrônico em seu poder, sem prejuízo do que dispõe o caput deste artigo; e
  6. Fica permitida a utilização de registro de ponto por exceção à jornada regular de trabalho, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.

O ROLIM permanece à disposição para quaisquer esclarecimentos relacionados aos efeitos da Lei da Liberdade Econômica. O presente informe apresentou uma síntese dos principais dispositivos da Lei nº 13.874/2019. Para maiores informações, recomenda-se a leitura da íntegra da Lei e dos regulamentos que serão editados.