Foi publicada, no último dia 17 de setembro, a Lei nº 14.973/2024 que, além de instituir a manutenção da desoneração da folha de salários para 2024 (aqui) e a possibilidade de transação na cobrança de interesse regulatório para as autarquias e fundações públicas federais (aqui), definiu a nova regulamentação dos depósitos judiciais e extrajudiciais realizados no interesse da Administração Pública Federal.
A norma revogou a Lei nº 9.703/1998, que há mais de 25 anos regulava o tema, e ampliou a sistemática, antes válida somente para os depósitos judiciais e extrajudiciais de tributos e contribuições administrados pela Receita Federal do Brasil (RFB), para os processos administrativos e judiciais em que figure a União, qualquer de seus órgãos, fundos, autarquias, fundações ou empresas estatais federais.
Foram mantidas algumas questões procedimentais, como a necessidade de que os depósitos judiciais dos tributos e contribuições administrados pela RFB sejam realizados via Darf específico, na Caixa Econômica Federal, devendo os valores serem transferidos diretamente para a Conta Única do Tesouro Nacional.
Contudo, a nova Lei alterou substancialmente a forma de correção monetária dos depósitos que forem objeto de devolução após ordem judicial ou administrativa, passando a prever que o levantamento dos valores por seu titular, serão “acrescidos de correção monetária por índice oficial que reflita a inflação” (art. 37, II).
Sob a vigência da Lei nº 9.703/1998, a previsão era a de que sobre os valores depositados incidiria a correção monetária pela Taxa Selic, mesmo índice utilizado para a compensação e restituição do indébito tributário. Essa era uma garantia ao contribuinte em contrapartida ao fato de que os valores eram imediatamente disponibilizados ao Tesouro Nacional.
Na prática, a nova norma está substituindo a Selic por um índice de inflação, como o IPCA, descasando a correção monetária do depósito judicial ou extrajudicial, garantia do crédito tributário, do índice de correção do próprio tributo pela Fazenda Pública.
Em uma primeira análise, verifica-se que a alteração legislativa viola o princípio da isonomia, na medida em que a União poderá cobrar o seu crédito tributário com o índice que reflete correção monetária mais juros de mercado (Taxa Selic), enquanto o contribuinte terá a devolução do seu capital imobilizado apenas com correção inflacionária.
A previsão vai na contramão, inclusive, da Emenda Constitucional 113/2021, que determina que, nas discussões e condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza, haverá a incidência da Selic, para fins de atualização monetária, remuneração do capital e compensação da mora.
Além disso, a norma viola a boa-fé do contribuinte, ao prever a aplicação da nova forma de correção monetária aos valores depositados na Conta Única do Tesouro Nacional a partir da data da sua publicação. Isso em razão de permitir a retroação do novo regime jurídico para atingir valores atualmente depositados.
De toda forma, aguarda-se a edição de regulamentação por parte do Ministério da Fazenda para dispor as questões procedimentais, inclusive, a indicação do índice oficial de correção que reflita a inflação.
Diante dos sólidos argumentos por uma inconstitucionalidade/ilegalidade da norma, a equipe da área de Tributário do Rolim Goulart Cardoso encontra-se à disposição para mais esclarecimentos, inclusive para avaliar a possibilidade de se requerer a substituição dos depósitos judiciais e extrajudiciais por outra forma de garantia.