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COP 28 em foco: financiamento climático; perdas e danos; transparência

Dando seguimento à nossa preparação para a COP28, nesta semana apresentamos um informe que aborda o financiamento climático como uma ferramenta crucial no enfrentamento aos riscos das mudanças climáticas. Nesse sentido, queremos distinguir algumas concepções desse que é um dos temas centrais da Conferência, notadamente por se reconhecer o papel crítico que o financiamento pode exercer no enfrentamento desses desafios, bem como as oportunidades econômicas dele decorrentes.

Segundo a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCC), financiamento climático é a contribuição local, nacional ou transnacional proveniente de fontes públicas ou privadas, com o fim de apoiar ações de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. O financiamento pode viabilizar uma miríade de projetos, desde os que se enquadram na mitigação dos efeitos das emergências climáticas, até como resposta às perdas e danos dos eventos extremos.

Existem três aspectos relevantes quando se aborda o financiamento climático. O primeiro, é a relação lógica entre a disponibilidade de recursos e o enfrentamento das perdas e danos. O segundo, refere-se às formas de transferência desses recursos. E, por fim, a relação do financiamento climático com a transparência e a boa governança das organizações

É certo que as mudanças climáticas causam impactos significativos em diversos setores econômicos, incluindo o agronegócio, o turismo, a infraestrutura e a energia. Estima-se que, só nos Estados Unidos os danos já ultrapassam a cifra de USD 150 bilhões em 2023. Dessa forma, todas as regiões estão suscetíveis às mudanças no clima, embora as comunidades com infraestrutura precária sejam ainda mais sujeitas aos danos socioambientais e econômicos. 

A expressão “perdas e danos” relaciona-se às consequências econômicas e não econômicas das mudanças climáticas que afetam a sociedade, para além dos mecanismos disponíveis de adaptação, como tratamos no informe anterior. Nesse sentido, servem de exemplo o desmatamento, a desertificação antropogênica, o derretimento das geleiras, a poluição e as alterações na composição dos oceanos, a diminuição dos mananciais de água doce, o aquecimento global e as migrações climáticas.

Os efeitos trazem prejuízos aos ciclos produtivos e perdas para toda a sociedade, principalmente as populações tradicionais e vulneráveis. A mitigação dessas perdas pode ocorrer por meio de novas políticas públicas de financiamento que considerem soluções de enfrentamento pragmático, especialmente fornecendo a ambiência de incentivos e de segurança jurídica necessários para que os financiamentos de fato aconteçam.

Nesse sentido, as oportunidades são muitas no que tange à transferência de recursos. Mesmo o crítico cenário geopolítico pode trazer incentivos aos processos de financiamento. Embora parte dos recursos estrangeiros sejam direcionados às conflagrações bélicas, é certo que, em cumprimento aos compromissos internacionais, uma parte desses recursos financeiros podem migrar dos países centrais para investimento em projetos de descarbonização da economia nos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos. A pressão na COP 28 será pela correção da morosidade e do desequilíbrio desses repasses. Para isso, será preciso estabelecer prazos e enforcement por meio de novos mecanismos de transferência de recursos para o financiamento de projetos de grande porte – como são característicos os projetos de logística e infraestrutura – bem como os de pequeno porte em contextos dos governos subnacionais, que necessitam de simplificação e flexibilização burocrática.

A necessidade de transferência dos recursos foi bem dialogada na COP 26, com os Diálogos de Glasgow, com o fim de enfrentar as “perdas e danos”. Em outubro de 2023, o Conselho da União Europeia divulgou o relatório dos trabalhos preparatórios para a COP 28 (ST-14285-2023-INIT), assinalando a necessidade de aprofundar o empenho internacional por meio de um forte multilateralismo e de ampliar as oportunidades de “investimentos e financiamentos, competitividade, inovação, criação de empregos e crescimento econômico”, saúde, empregos dignos e preços de energia acessíveis. O relatório traz especial destaque para o “potencial dos bancos multilaterais de desenvolvimento e das instituições financeiras internacionais, incluindo o Grupo do Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Europeu de Investimento, para contribuir para mecanismos de financiamento destinados a dar resposta às perdas e danos”. Assim, o Conselho europeu compromete-se a tomar medidas para intensificar as formas de financiamento e de seguros para os riscos climáticos e de catástrofes (CDRFI) e “tornar a arquitetura mundial do CDRFI mais sistêmica, coerente e sustentada”.

A governança das organizações precisa ser adequada às novas exigências do tabuleiro global. A consultoria internacional EY divulgou recente relatório em que destaca a capacidade do mercado em acelerar essas mudanças, com maior empenho por alinhamento das regras de visibilidade e transparência. A transparência envolve relatar as iniciativas positivas implementadas na redução de emissões de carbono, bem como a disposição em reconhecer erros, identificar áreas que necessitam de melhorias, e divulgar tanto as metas concretizadas como aquelas a serem alcançadas. Assim, é preciso um melhor envolvimento e coordenação multinível entre as hélices: governos, mercado e Academia. São muitas as formas de aprofundar o engajamento entre as partes interessadas, desde disponibilizar a participação das partes interessadas em fóruns e audiências públicas, até facilitar oitiva no processo de formação das políticas. Assim, as ações e interesses tornam-se mais transparentes e equitativos, aumenta-se a responsabilidade na alavancagem das mudanças necessárias para a descarbonização da economia.

Para a COP28, espera-se que os países desenvolvidos apresentem propostas concretas para cumprir o compromisso de disponibilizar US$ 100 bilhões por ano às nações em desenvolvimento. É crucial que o Brasil se envolva ativamente nos debates, contribuindo para a consolidação da nova meta, levando em consideração a realidade do país e suas principais necessidades de financiamento.

Os setores econômicos que têm recebido destaque nas discussões sobre financiamento climático, devido às suas significativas emissões de gases de efeito estufa (GEE), incluem principalmente os setores de energia, com foco nas conversas sobre a necessidade de desinvestimento em combustíveis fósseis, e a agropecuária. No Brasil, a Política Nacional sobre a Mudança do Clima (Lei 12.187/09) estabelece, em seu artigo 8º, que as instituições financeiras oficiais devem disponibilizar linhas de crédito e financiamento específicas para promover atividades alinhadas aos objetivos da PNMC.

É relevante destacar que a obtenção de financiamento climático é um processo que está condicionado ao atendimento de critérios socioambientais e econômicos específicos. Para acessar recursos financeiros destinados a investimentos em projetos de baixo carbono, é essencial cumprir com os padrões de desempenho socioambientais estabelecidos pela instituição financeira. Além disso, critérios como garantias, taxas de juros, amortizações, carência para pagamento, plano de reembolso e a escolha entre acesso direto ao fundo ou por meio de intermediários são fatores determinantes.

Em síntese, as avaliações necessárias para a concessão de financiamentos climáticos são altamente específicas, variando conforme o tipo de instrumento financeiro e a complexidade dos projetos em questão. Estas fases abrangem desde a análise de riscos e impactos socioambientais até consultas às partes interessadas, monitoramento da conformidade socioambiental para o desembolso dos recursos financeiros, e, por fim, a avaliação econômica, que frequentemente é a etapa culminante desse processo.

Destaca-se, particularmente, a relevância da avaliação socioambiental como uma etapa condicionante e necessária no ciclo de concessão de crédito. Essa dimensão específica possibilita a obtenção de condições mais vantajosas de financiamento, muitas vezes através de recursos subsidiados destinados à promoção da sustentabilidade ou à eliminação de possíveis impactos negativos do projeto. Vale ressaltar que as etapas da avaliação socioambiental são adaptáveis de acordo com o nível de risco associado ao projeto proposto.

Em conclusão, a integração cuidadosa de avaliações multifacetadas durante o processo de concessão de financiamentos climáticos não apenas fortalece a base financeira, mas também ressalta o compromisso com a responsabilidade socioambiental. Estas práticas visam não apenas garantir a viabilidade econômica dos projetos, mas também contribuir efetivamente para o enfrentamento dos impactos das mudanças climáticas.