Aspectos Tributários da Nova Lei de Falências

Foi publicada, no último dia 24 de dezembro, a nova Lei de Falências (Lei nº 14.112) alterando disposições da Lei 11.101/2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. A nova Lei também promove, dentre outros, modificações no tratamento dos créditos fiscais, especialmente no procedimento de verificação e habilitação, criação de parcelamentos especiais com abatimento de prejuízos fiscais e bases negativas de CSLL, e ainda permite ao devedor apresentar proposta de transação tributária à Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) em relação aos créditos inscritos em dívida ativa da União.

– Verificação e habilitação dos créditos fiscais

A nova Lei acrescentou disposição específica, que antes não existia, acerca da verificação dos créditos fiscais, prevendo que o juiz intimará cada Fazenda Pública para apresentar o detalhamento de seus créditos inscritos em dívida ativa. Os créditos não definitivamente constituídos, não inscritos em dívida ativa ou com exigibilidade suspensa poderão ser informados em momento posterior. Será dada oportunidade ao devedor, demais credores e administrador judicial de debater os cálculos e classificação.

Além disso, a Lei determina que a decisão sobre os cálculos e a classificação dos créditos, assim como sobre a arrecadação dos bens, a realização do ativo e o pagamento aos credores, competirá ao juízo falimentar. Já a decisão sobre a existência, a exigibilidade e o valor do crédito, bem como sobre o eventual prosseguimento da cobrança contra os corresponsáveis, competirá ao juízo da execução fiscal.

A nova Lei também prevê, expressamente, que as execuções fiscais permanecerão suspensas até o encerramento da falência, sem prejuízo da possibilidade de prosseguimento contra os corresponsáveis.

– Classificação dos créditos tributários e previsão quanto aos créditos tributários extraconcursais

Os créditos tributários mantêm-se na mesma ordem de classificação, ou seja, após os créditos derivados das dívidas trabalhistas e dos créditos gravados com direito real de garantia até o limite do valor do bem gravado. A nova Lei, no entanto, reclassificou como créditos tributários extraconcursais os “tributos relativos a fatos geradores ocorridos após a decretação da falência”.

– Implicações da decretação da falência e processamento da recuperação judicial nas execuções fiscais

Não se aplica às execuções fiscais a regra geral de suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor e das execuções ajuizadas contra o devedor, bem como a proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência.

Sobre o tema, a nova Lei conferiu ao juízo da recuperação judicial a competência para determinar a substituição dos atos de constrição que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial até o encerramento da recuperação judicial. Assim, esses atos continuam regulados pela Lei de Execução Fiscal, mas a substituição da penhora, caso o bem seja essencial à manutenção da atividade empresarial, compete ao juízo da recuperação judicial, reduzindo a interferência da Fazenda que, nas execuções, invariavelmente discorda da substituição dos bens penhorados.

Essa competência do juízo da recuperação judicial aplica-se também às execuções fiscais relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores em razão da fiscalização de trabalho e às execuções de ofício das contribuições sociais do empregador sobre a folha de salários e dos segurados, vedando-se a expedição de certidão de crédito e o arquivamento das execuções para efeito de habilitação na recuperação judicial ou falência. Dessa forma, preserva-se o direito de o devedor discutir a existência do crédito tributário no âmbito da execução fiscal.

– IR e CSLL sobre ganho de capital resultante da alienação de bens ou direitos em recuperação judicial

O IR e a CSLL incidentes sobre o ganho de capital resultante da alienação de bens ou direitos pela pessoa jurídica em recuperação judicial poderão ser parcelados, com atualização monetária das parcelas.

– Vedação à extensão da falência e seus efeitos aos sócios, controladores e administradores

A nova Lei vedou, expressamente, a extensão da falência ou de seus efeitos, no todo ou em parte, aos sócios de responsabilidade limitada, aos controladores e aos administradores da sociedade falida, admitida, contudo, a desconsideração da personalidade jurídica, desde que sejam respeitados o devido processo legal e a ampla defesa assegurados pelo Código de Processo Civil e as hipóteses de extensão da responsabilidade a terceiros autorizadas pelo Código Tributário Nacional.

– Restituição em dinheiro de tributos à Fazenda Pública

A nova Lei estabeleceu a restituição em dinheiro às Fazendas Públicas, relativamente a tributos passíveis de retenção na fonte, descontos de terceiros ou de sub-rogação e a valores recebidos pelos agentes arrecadadores e não recolhidos aos cofres públicos. Tal restituição somente será efetuada após o pagamento dos créditos trabalhistas de natureza estritamente salarial vencidos nos 3 meses anteriores à decretação da falência, até o limite de 5 salários-mínimos por trabalhador.

– Dívidas tributárias e ampliação dos parcelamentos para os devedores em recuperação judicial

A Lei promoveu alterações na Lei nº 10.522, de 2002 (art. 10-A, 10-B e 10-C), ampliando as condições para a concessão de parcelamentos e regularização da situação fiscal do contribuinte em recuperação judicial. O número de parcelas foi estendido de 84 para 120, com a consequente redução do valor de cada parcela. Também foi concedida a oportunidade de se liquidar até 30% da dívida consolidada com a utilização de prejuízos fiscais e de bases de cálculo negativas da CSLL, ou com créditos próprios relativos a tributos administrados pela RFB, parcelando-se o restante, neste caso, em até 84 parcelas.

Como condição de adesão ao parcelamento, o devedor deverá fornecer à RFB e PGFN informações bancárias, extratos de fundos ou aplicações financeiras e demais ativos futuros, bem como manter a regularidade fiscal. Além disto, deverá amortizar o saldo devedor do parcelamento com um percentual do produto de cada alienação de bens e direitos integrantes do ativo não circulante. O percentual, neste caso, observará o limite máximo de 30% do produto da alienação, e corresponderá à razão entre o valor total do passivo fiscal e o valor total de dívidas do devedor, na data do pedido de recuperação judicial.

– Transação tributária

Os devedores em recuperação judicial poderão submeter à PGFN proposta de transação relativa a débitos inscritos em dívida ativa da União, observando-se (i) o prazo máximo de 120 meses (podendo ser ampliado em mais 12 meses no caso de devedor que realize projetos sociais), e (ii) o limite máximo para reduções será de 70%.

Outras condições para a proposta de transação tributária estão previstas na lei, utilizando-se como parâmetros: a) a recuperabilidade do crédito, inclusive considerando eventual prognóstico em caso de falência; b) a proporção entre o passivo fiscal e o restante das dívidas do sujeito passivo; e c) o porte e a quantidade de vínculos empregatícios mantidos pela pessoa jurídica.

Fica permitido aos devedores que já estejam em recuperação judicial, no prazo de 60 dias, contado da regulamentação da transação tributária, apresentar a respectiva proposta posteriormente à concessão da recuperação judicial.

Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão, por lei de iniciativa própria, autorizar a aplicação da transação tributária nos moldes da União em relação aos seus créditos.

 As disposições da nova Lei aplicam-se de imediato aos processos em curso, respeitados os atos já praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.

A Lei entra em vigor 30 dias após sua publicação.